sábado, 16 de julho de 2011

Projeto busca formas de garantir a permanência das famílias em Canudos.

A cidade, na Bahia, palco da guerra no final do século 19, foi reconstruída mais de uma vez. Hoje, ainda é um dos municípios mais pobres do Brasil.

A cidade de Canudos, na Bahia, palco da guerra no final do século 19, foi reconstruída mais de uma vez. Hoje, ainda é um dos municípios mais pobres do Brasil.
Para mudar essa realidade, a Universidade do Estado da Bahia, criou o Projeto Canudos, com a participação de mais de 40 organizações.
No fim do século 19, um homem magro, de barba e cabelos longos chegou a Canudos pregando o fim da injustiça social.
“Canudos era uma cidade trevo. Tinha estrada para todos os lados. Era um lugar de movimento. Ele pensou em se estabelecer no lugar com os seguidores”, explica o documentarista Claude Santos.
O pequeno grupo virou uma multidão em volta de Antonio Conselheiro. A revolta popular se transformou em guerra.
“Na realidade, se queria consolidar a República. Grupos políticos estavam brigando, querendo derrubar Prudente de Morais. O povo de Canudos paga por isso”, avalia o documentarista.
O conflito acabou quase um ano depois com uma população dizimada e uma cidade destruída.
“Os sobreviventes da guerra voltaram e começaram a reconstruir a cidade no início do século 20”, completa Santos.
No final da década de 90, a cidade reconstruída foi alagada com a criação de um açude. Com Canudos debaixo da água, pouco sobrou do cenário da guerra.
“Ficou o Parque de Canudos, que é uma zona um pouco afastada. A universidade preservou esse sítio histórico arqueológico e fez pesquisas”, explica Luiz Paulo Neiva, coordenador do Projeto Canudos.
A Universidade do Estado da Bahia trabalha há 25 anos para manter esse patrimônio.
“Quando entram no parque, as pessoas se defrontam com o sentimento da guerra. Nós temos o Vale da Morte, uma espécie de um cemitério militar. Nós temos o auto da favela, o local principal aonde a quarta expedição chegou e colocou a sua artilharia para atingir Canudos. Nós temos a fazenda velha e os hospitais de sangue. Enfim, esses sítios todos estão demarcados”, diz Paulo Neiva.
São mais de mil hectares de história, abertos à visitação e com entrada gratuita. “É o único palco de guerra estudado e delimitado do nosso país. Tem uma visitação razoável com cinco mil pessoas por ano”, explica Santos.
A 13 quilômetros do parque e da cidade submersa, nasceu a atual Canudos, a 410 quilômetros de Salvador. No centro, o Memorial Antônio Conselheiro abriga parte do acervo da guerra.
Durante uma estiagem, o açude secou e os arqueólogos conseguiram recuperar objetos importantes, como as seringas dos hospitais da guerra.
“Sempre que foram encontradas, todas as seringas estão em caixinhas de ferro, que dá para jogar o álcool, jogar o fogo e esterilizar”, diz a arqueóloga Cleonice Vergne.
São armas e munição com mais de um século. “Em seguida, você pode transformar esses bens patrimoniais, arqueológicos ou históricos em áreas de visitação turística, desde que essa visitação reverta em subsídios econômicos para as comunidades locais carentes”, lembra Cleonice.
A guerra aconteceu há mais de cem anos. Mas a luta do povo agora é contra a pobreza e o atraso sócio econômico. A cidade tem um dos piores índices de desenvolvimento humano do país. Mudar essa realidade é o atual desafio de Canudos.
“Nós refletimos com a comunidade a ideia de promover um desenvolvimento que fosse fundado na eficiência econômica, mas também fundado na equidade social e na prudência ecológica. O Projeto Canudos nasce com a ideia da promoção de um desenvolvimento sustentável não como modismo, mas como um desenvolvimento sustentável próprio, com cara dessa região e com voz do povo dessa região”, diz Paulo Neiva.
Uma vez por mês, uma enorme roda se forma para discutir problemas e procurar soluções. São 43 representantes da sociedade civil que, unida, começa a reescrever a própria história.
“Meu negócio é roça. Se for lá me encontrar, você vai me ver de botina e todo maramanhado. Eu só ando sujo. Eu gosto é de roça”, diz o morador.
O morador Domingos Humberto Macedo passou boa parte da vida fora da terra natal. Os filhos continuam longe. “Futuramente, eu melhorando, quero que eles voltem para ficar comigo”, planeja.
“A estratégia principal é da participação da população. Com isso, juntamos o conhecimento técnico e o conhecimento popular para trabalharmos para que a gente possa estudar os problemas e as potencialidades, desenvolver pesquisas e estudos, mas em todas as áreas do desenvolvimento”, explica Paulo Neiva.
O projeto tem cerca de 30 pesquisadores e professores. Canudos vive praticamente da banana. Todo ano, os produtores enfrentam o mesmo problema.
“A ideia seria que a gente montasse um sistema integrado entre produção orgânica, mudança do sistema de irrigação, localizando a água, e o manejo orgânico para que a gente pudesse avaliar os efeitos do vento sobre essa nova condição. Nos últimos dois anos, não houve tombamento de plantas”, diz Paulo Neiva.
Em breve, os 300 pequenos agricultores poderão adotar as mudanças da unidade teste.
O açude Cocorobo, criado para abastecer mais de 20 municípios, atinge apenas uma parte de Canudos. A quantidade de peixe também diminuiu radicalmente.
“É uma média de 60 toneladas ao mês. Depois da implantação da pesca predatória, hoje mesmo a produção não chega a dez toneladas por mês”, calcula Evaldo da Silva, presidente da colônica dos pescadores.
Uma solução imediata foi implantar a criação de peixe em cativeiro. “A piscicultura vem a somar com a pesca artesanal, facilitando os estoques se recuperarem. A quantidade de pescadores na atividade vai diminuir. Eles vão estar cuidando dos tanques. Os estoques naturais vão se recuperar”, diz Lucemario Xavier Batista, professor do curso de engenharia de pesca.
A meta é instalar dez tanques para cada pescador.
O agricultor Lúcio Conceição Santos passou por capacitação técnica do projeto e ensina os vizinhos um novo método de fazer ração. A energia elétrica e a água do açude não chegam a casa dele. “A seca é um fenômeno da natureza. A gente não consegue acabar com a seca, mas aprende a conviver com ela”, diz.
São alternativas que o Projeto Canudos ajudou a executar. Adubo orgânico, cisterna e a mata nativa preservada ajuda a proliferar as abelhas na região. Pelo menos duas vezes ao dia, eles se aventuram na mata.
Trinta apicultores produzem cem toneladas por ano. “A apicultura não trabalha só com a atividade prática. Nós precisamos de desenvolvimento técnico. Então, o Projeto Canudos conta também com o profissional dessa área. Temos certeza que através do projeto nós podemos agregar mais valor no produto”, diz João Evangelista, presidente da Associação dos Apicultores.


O Projeto Canudos se preocupa com a formação das crianças. A idéia é melhorar a qualidade das aulas e apresentar uma educação que valorize a história e a cultura da região.

(Fonte: Programa AÇÃO - Rede Globo)

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